domingo, 1 de abril de 2007

Nem tudo é o que parece

Acácio, uma velha cegonha-preta reformada, habituada às hostilidades das regiões interiores e isoladas, a mais forte e mais experiente do bando, recorda hoje uma missão que cumpriu há pouco mais de um quarto de século.

Chegada a Primavera, os pedidos de herdeiros ao berçário celeste multiplicavam-se. O processo de selecção e distribuição das crias, bem como a organização do transporte decorrera dentro do que estava previsto.

Ambrósio, um maguari de alta competição, capaz de igualar em velocidade um falcão-peregrino, ficara encarregue de levar o ‘berço K’, por sinal o bebé mais resmungão que por ali passara nos últimos tempos. Para os mandarins importados directamente da Austrália que habitualmente cuidavam dos rebentos, foi um autêntico alívio. Constava-se que o catraio congeminava a revolução de toda a sala contra o leite em pó!

Embrulhou-o numa fralda alcochoada e resistente às diferenças térmicas das atmosferas, e partiu em direcção à morada indicada.
Regressou furioso poucos minutos depois, reclamando uma indemnização por danos morais. Então não é que o embrulho, mal haviam descolado, já lhe tinha arrancado um punhado penas do peito? Como poderia agora participar nos documentários do National Geographic?
Keminho regeressou ao berço K e ficou de castigo, em regime de isolamento durante 2 dias.

Fizeram-se os preparativos para uma nova viagem, rumo à que iria ser a sua casa de sempre. Escolheu-se para isso Gertrudes, uma cegonha-branca-oriental encantadora, com a mais sedutora penugem branca e peito de rola, cobiçada por todos os voadores dos céus.
Poucos minutos passaram até se aperceber que levava o malandro pendurado no decote!...
Escandalizada com o atrevimento, voltou para trás no mesmo instante, e só não largou a trouxa porque iria, certamente, para o desemprego.

Tentou a cegonha Júlio, Aurora, Agostinho, Francisca… Todos tentaram a proeza de levar o Keminho a casa, infrutiferamente…

Foi quando se contratou o Bob, uma musculada cegonha-de-storm, com óculos escuros e casaco camuflado. Bob não falharia a entrega daquele pestinha, pensavam todos.
A primeira meia-hora, o tempo suficiente para Keminho engendrar um plano, decorreu sem complicações. Bob já dava a tarefa por cumprida, quando o pequeno começa a contar uma história que ouvira às catatuas. Os sacis, mais conhecidos por cucos, preparavam uma armadilha a Bob naquela viagem. Nunca o perdoaram por não lhes ter emprestado o ninho, na época anterior!
A história era metade verdade, metade criação. O ressentimento dos cucos era verdadeiro, mas não a armadilha. E com isto, rapidamente convenceu a cegonha-de-storm a regressar ao berçário.

Não é que Keminho não quisesse chegar a casa, queria, mas na verdade, dava-lhe um certo gozo pôr todos à beira de um ataque de nervos!

Desesperados com a aproximação do prazo da entrega, foram então aconselhar-se com o velho Acácio. Ouviu, acariciou as barbas enquanto pensava e decidiu fazer ele mesmo a viagem! As articulações estavam um pouco enferrujadas e a caixa-de-ar reduzida a metade, mas não perdia nada em tentar.

Partiu no dia 1 de Abril, sobrevoando as margens do Douro e os taludes onde, ao sol primaveril, amadureciam os bagos de uva.
Acácio ia voando e trauteando histórias daquelas paragens, de conquistadores e conquistados, da abundância e de fome, de amores e desamores, que o catraio, de cabelo espetado e olhar de rufião, ouvia absolutamente extasiado. Remonta aqui o seu profundo respeito pela sapiência das barbas brancas.

Pernoitaram em terras de Alvarinho, que passariam a ser também as suas, as que haviam escrito a história dos seus antepassados.

À morada dos futuros papás, chegou no dia seguinte.
Acácio colocou-o à porta, adormecido num berço azul e branco que arranjara pelo caminho. Num alfinete-de-ama preso aos lençóis deixou um bilhete dizendo: ‘Nem tudo é o que parece!’.

Keminho tornou-se Kemo! De nome completo, Kemo Pan ResSabe.

Não se poupou a arranhões e nódoas negras, melhor, continua sem se poupar a arranhões e nódoas negras, e lá vai seguindo o seu caminho, meio perdido, meio encontrado, entre o devaneio e a realidade.

Os Parabéns e as prendas ficam por conta dos amigos. Nós, ressabiados deste blog, limitamo-nos a recordar-te que agora o arredondamento é para os trintas!...

Tenha um bom dia, Sr. Kemo Pan ResSabe! Especialmente hoje, o team d’ O Ressaibo brinda a si!...

1 comentário:

Francesinhus disse...

Canecos, vende isto para um show da TVI!!!

PARABÉNS OH AZEITEIRO!!!