domingo, 4 de março de 2007

Liderança ou o Princípio de Peter

"Em um sistema hierárquico, todo funcionário tende a ser promovido até seu nível de incompetência"

Embora em brasileiro, esta definição do Princípio de Peter (PP) espelha bem um problema regular da nossa função pública, ou administração central. E como o peso do Estado é enorme, a quantidade de incompetentes é incomensurável.

Durante estes anos, estive em contacto próximo, sobre alçada de, chefiado, gerido, liderado, por muitos administradores públicos. Durante o tempo de faculdade, cada regente era o líder da sua cadeira, do seu departamento. Cada órgão de gestão com o seu líder com poderes quase descricionários. No hospital, cada director de serviço, departamento, ala ou enfermaria é (ou devia ser) um líder.

A escolha de líder em Portugal, pelo menos na função pública, espelha bem o PP. Para regente de uma cadeira, costuma ser escolhido o gajo com mais artigos publicados, o gajo cientificamente mais produtivo, desde que com os cabelos brancos suficientes. Terrivelmente, isto é um tiro no pé. Chefiar o que quer que seja obriga a perder tempo com papelada, com burocracia, com reuniões, com o staff. Deixa-se de poder investigar, produzir ciência. Cabelos brancos (pelo menos muitos) provoca uma perda acentuada na capacidade de lutar, de intervir. Um bom investigador está habituado a estar horas e horas sozinho com o seu microscópio, com os seus ratinhos, com os seus manuais, com os seus papeis. Não está habituado a ser a força motriz de uma equipa multidisciplinar. Está habituado a ser o orador, e não o ouvinte atento das opiniões, desabafos e problemas da sua equipa. As competências de liderança são francamente diferentes das competências de investigação, de docência.

Nos hospitais passa-se o mesmo. Para directores, vão os médicos conceituados, velhos, que já não tem mão para operar. Sem dinamismo. Sem capacidade de consensualização. Citando a Dama de Ferro 'O consenso é a negociação da liderança'.

É completamente diferente uma equipa dizer que trabalha com que uma que diga trabalha para. A primeira é muito mais eficaz, muito mais produtiva. Líder ouve os colaboradores, leva os colaboradores às conclusões e orientações que quer. Chefe manda e pronto. Sem explicações de porquê.

Quantos líderes temos nós na nossa função pública?

Desde o porteiro ao director de escola, toda a gente se habitua ao poder descricionário. Quem selecciona quem pode entrar ou não numa urgência hospitalar? Até à bem pouco tempo eram os porteiros. Estilo discoteca.

Este ressabio pode parecer ter muita coisa nas entrelinhas e pouco 'à vista'. É isso mesmo. Quando se tem um chefe descricionário e não um líder, é preciso falar nas entrelinhas.

Seguindo o mesmo tema das entrelinhas, o capítulo seguinte será 'Regras... Um meio ou um fim?'

1 comentário:

Freddy disse...

Que diabo, estou orgulhoso da tua escrita... Já agora, falta muito para chegarmos à Madeira?